Entenda como a exposição às redes sociais afeta no desenvolvimento emocional, social e psicológico dos jovens
Por Beatriz Matsuda, Beatriz Missaka, Isabella Travaglia e Nina Scarpelli
Sete em cada dez crianças de 7 a 15 anos não gostam de seus corpos e metade delas gostariam de ser mais magras, segundo dados publicados na revista Eating and Weight Disorders. Absurdo, não acha? Cada vez menos crianças estão brincando de pega-pega, esconde-esconde e outras brincadeiras que costumávamos fazer na infância. Nos parques, escorregadores e balanços estão sendo abandonados, enquanto celulares, maquiagens e acessórios passam a fazer parte da rotina infantil. Essa mudança de hábito está sendo causada pelas redes sociais, que influenciam esse público com seus padrões de beleza inalcançáveis e incentivos a comportamentos adultos.
A adultização infantil deixou de ser exceção e se tornou uma realidade recorrente na vida dos jovens, causando preocupação. É inegável que, com os avanços tecnológicos, a atual infância das crianças vai ser diferente da infância de quem antecedeu esse mundo virtual. Mas até que ponto a presença de ferramentas tão poderosas, como os celulares e a internet, é aceitável na formação dessas crianças?
Pressão estética
“Gente rica ou francesa, ou que entende muito de moda, é apaixonada por magreza. Eu não estou nada magra para eles ou para brasileiros da elite. Agora, gente mais simples vai me achar magra. É normal, gente, desde que história é história.” A declaração da influencer Maya Massafera gerou grande polêmica e reacendeu o debate sobre como a magreza ainda é tratada como símbolo de status e pertencimento social. A partir de percepções subjetivas sobre o que é “belo”, surgem ideais que se modificam conforme os valores e estruturas sociais ao longo do tempo.
“Atualmente, acredita-se que o que determina o bonito e o feio é a classe social. Quem é visto como bonito, muitas vezes, tem recursos financeiros para manter ou construir essa aparência”, afirma a psicóloga Caroline Luise Travaglia. Na Idade Média, por exemplo, o alimento era considerado uma ‘benção divina’ por sua escassez, e por isso, a gordura era valorizada esteticamente, como aponta o artigo “O gordo, o belo e o feio: o embate entre a obesidade e padrões estéticos”. Nos dias de hoje, a magreza é valorizada. Um dos motivos é que, assim como antigamente, o corpo perfeito é associado ao status social, tendo em vista que acompanhamento de nutricionista, produtos saudáveis, academia, etc., custam tempo e dinheiro. Sem contar com o fato de que o “corpo ideal” fica cada vez mais fantasioso, exigindo ainda mais dos procedimentos estéticos.
Se os adultos são tão afetados por essa pressão estética, imagina o que ela causa nas crianças? A psicóloga Caroline afirma que “aos 5 anos, as crianças começam a se sentir pressionadas a cuidar da aparência”. A psicóloga Milena Fuzaro complementa que “traumas, inseguranças, sentimento de não pertencimento e inadequação são consequências que certamente as crianças levarão para o resto da vida”
Denúncia da adultização infantil
Em agosto de 2025, o influenciador Felipe Bressanim Pereira, mais conhecido como Felca, postou o vídeo “Adultização”, que ultrapassou 50 milhões de visualizações, denunciando que crianças estão sendo incentivadas a agir, vestir e a se comportar como adultos para agradar o algoritmo. O vídeo trouxe à tona casos de meninas com 8 ou 9 anos se maquiando para vídeos no TikTok e reproduzindo comportamentos e expressões com conotações adultas, muitas vezes impulsionadas pelos próprios pais interessados em obter engajamento. Felca mostrou o que muitos preferiam não ver ou simplesmente ignorar: a infância virou produto.
O vídeo provocou uma onda de debates, denúncias, investigações e até prisões, revelando que a adultização infantil não é apenas uma tendência do momento. É o sintoma de uma geração que ensina que o valor de alguém está no número de curtidas e visualizações.
“A adultização infantil pode estar ligada à estética também, principalmente quando a criança tem acesso a conteúdo de pessoas mais velhas, ou recebe esse estímulo em casa”, diz a psicóloga Mônica Kakucsi Marinho. Ao expor os filhos a conteúdos inadequados para a idade ou ao valorizar excessivamente a aparência, os responsáveis podem, mesmo sem intenção, reforçar padrões estéticos adultos e expectativas que não condizem com a fase infantil.
O papel das redes sociais
As redes sociais têm se tornado o principal impulso para a pressão estética entre crianças e adolescentes. Cada vez mais, é normalizado e até banalizado o fenômeno das jovens “influencers digitais” que promovem produtos de beleza, dicas e itens muitas vezes caros e indicados apenas para adultos. A presença constante dessas plataformas exerce um papel central na vida desses jovens, influenciando hábitos, comportamentos e a forma como se enxergam diante do espelho. Um estudo realizado com estudantes do Rio Grande do Sul mostrou que 95% dos alunos do ensino médio têm acesso à internet, e 24% tiveram seu primeiro contato antes dos 6 anos, evidenciando a exposição precoce ao ambiente digital.
O TikTok se tornou uma vitrine de padrões de beleza, onde é comum ver meninas exibindo rotinas complexas de skincare e maquiagem com produtos que nem sempre são adequados para peles sensíveis. Boa parte desses conteúdos é cuidadosamente editada, com iluminação e ângulos perfeitos, criando imagens idealizadas que pouco correspondem à realidade. Isso desperta nas jovens o desejo constante de manter uma aparência impecável, acreditando que, para serem aceitas, precisam estar sempre maquiadas, com a pele perfeita e penteados impecáveis, sem espaço para qualquer tipo de “imperfeição”.
A fisioterapeuta dermatofuncional Julianna Marinho Gonzalez ressaltou um aumento significativo de adolescentes querendo realizar tratamentos e utilizar cosméticos que não são indicados para sua faixa etária. “Já tive uma adolescente de 13 anos querendo realizar um procedimento invasivo com a responsável presente dando autorização. Nesses casos, nego a realização do tratamento e oriento que existe idade estabelecida para certos tipos de tratamento”, comentou.
Trends e o algoritmo
É por meio de “trends”, ou tendências, que os jovens se atualizam do que está em alta. São um conjunto de conteúdos diversos com alta popularidade durante um curto período de tempo, presentes principalmente em redes sociais como o TikTok e Instagram. Elas surgem e desaparecem do dia para noite e não só influenciam, mas moldam comportamentos, estilos e até mesmo formas de se pensar.
Por trás dessas tendências, estão os algoritmos: sistemas que determinam o que cada usuário verá em seu feed. Quanto mais uma criança ou adolescente interage com vídeos sobre beleza, moda ou estética, mais conteúdos semelhantes aparecem, criando um ciclo de reforço constante. As plataformas priorizam o que gera mais visualizações e engajamento, e não necessariamente o que é saudável para o desenvolvimento emocional desses jovens. Assim, trends de maquiagem, “get ready with me” e desafios estéticos acabam ganhando destaque, alimentando comparações, inseguranças e a busca por aceitação social.
Enquanto os jovens tentam acompanhar o que está “em alta”, os algoritmos transformam essa necessidade de pertencimento em lucro, e a pressão estética e a adultização infantil em verdadeiras moedas de engajamento.
Cultura dos filtros
É fato que a cultura da imagem perfeita não nasceu da noite para o dia. Ela começou a se fortalecer por volta de 2015 com o Snapchat, primeiroaplicativo a permitir o uso de filtros em tempo real, que afinava rostos, aumentava os olhos e suavizava imperfeições de forma divertida. O que inicialmente era apenas um recurso para entreter e brincar com a aparência, acabou se tornando um padrão de beleza digital. Pouco tempo depois, outras plataformas incorporaram ferramentas parecidas, transformando os filtros em um elemento essencial para o engajamento. Com isso, a linha entre o “real” e o “fake” começou a se desfazer. Rostos filtrados começaram a dominar as telas e a ideia de beleza natural foi substituída por versões cada vez mais artificiais, o que para crianças e adolescentes se torna algo especialmente perigoso.
Somos todos reféns desses padrões

A magreza, hoje, é uma mercadoria. Quem nunca viu anúncios de shakes, cirurgias e aparelhos milagrosos para emagrecer? O conceito de beleza, historicamente ligado à fertilidade e à harmonia, foi transformado em produto.
Um estudo da Universidade Federal do Paraná observou o comportamento de crianças em diferentes faixas etárias em relação à percepção de padrões estéticos:
- Aos 4 anos, elas associam beleza à afetividade – pessoas queridas são bonitas.
- Aos 6 anos, repetem essa relação, considerando “bonito” quem é próximo. Algumas respostas do estudo assimilaram a beleza com roupas, cabelo e maquiagem.
- Aos 8 anos, apresentam a perspectiva de beleza interior e aspectos externos, como maquiagem e roupas novas. Também apontam que é importante ser bonito para gostarem de você.
- Aos 10 anos, surge a associação entre beleza, comportamento e “estar na moda”, com vínculos com conteúdo da internet e televisão.
- Aos 12 anos, muitos já relacionam aparência com aceitação social e pertencimento.
Esses dados mostram como a influência da família, da escola e, principalmente, das mídias, molda desde cedo a forma como as crianças percebem o que é considerado “bonito” e “aceitável”.
A psicóloga Caroline Louise Travaglia dá um conselho final aos pais: “É essencial orientar sobre o uso consciente da mídia, estimular o pensamento crítico, valorizar o tempo de brincar, reforçar o amor-próprio e promover conversas abertas sobre diversidade e respeito”.
Então, fica a pergunta: será que ainda dá tempo de reconectar a infância ao que realmente importa? Talvez o primeiro passo não seja proibir as redes sociais, mas mudar a forma como as apresentamos às novas gerações. A infância deve ser vivida, não exibida.
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IAs utilizadas: ChatGPT