De advogado formado pela USP ao sucesso no TikTok, com mais 80 mil seguidores nas redes sociais, Matheus Camargo tornou-se uma espécie de conselheiro que ensina as pessoas a socializarem sem medo. 

Por Adriana Matos, Leonardo Fagundes, Matheus Dias e Matheus Leal. 

O advogado que virou criador de conteúdo

Matheus Camargo está em pé no corredor do Shopping Paulista. Estamos combinando como faríamos a entrevista, quando de repente ele diz: “Espera, vamos gravar aqui mesmo”. Pede para ligar a câmera e então começa a gritar e gesticular no meio de todos. É uma surpresa para nós.

Inicia seu discurso ensaiado sobre o que faz na internet e fica um bom tempo explicando em detalhes como é seu trabalho, fala de mentalidade,  como não é necessário ser tímido, que é apenas pressão social, que nossos comportamentos são os mesmo de tribos pré-históricas. As pessoas em volta filmam, riem, ficam curiosas, e então ele encerra o discurso e faz um gesto para que o sigamos. 

“Vou mostrar na prática como fazer novas amizades. Ser desembaraçado é um treino, quanto mais você pratica mais sociável você é”, ensina.

Caminha confiante. Magro, não é alto. Está vestido com uma camisa polo, calça cáqui e um óculos preto quadrado modelo Wayfarer da Ray-Ban, que irá gravar em cada interação, ao passar pelas pessoas as cumprimenta. Elogia e se diverte em todo processo.

As pessoas se impactam, a maioria agradece, sorri, fica feliz, entabula uma conversa, contam problemas, trocam Instagram, apenas um achou estranho e reclamou, mas Matheus nem viu. Quando já estávamos confortáveis com suas ações, ele se joga no chão, deita e se justifica.

“Ninguém se importa com o que você faz, não acontecerá nada com você simplesmente por você ser quem você é, ou por falar com alguém, quanto mais eu ajo assim, mais meu cérebro entende que não há perigo.”

O ponto da virada nas redes sociais

Rimos juntos ao final de sua apresentação, Matheus Camargo é o típico amigo que as pessoas querem estar juntas, para que ele abra caminhos e conversas, apresente pessoas, Osmar Neto, seu sócio, fala que o conheceu em uma comunidade online e logo depois se encontraram em uma festa. Lá ficou admirado com o quanto ele era extrovertido e sabia ser sociável. Propôs que fizessem vídeos no YouTube sobre o tema, já que trabalhava com marketing.

“Um tipo de vídeo que está viralizando muito na gringa são vídeos de reações reais gravadas com um óculos Ray-Ban que ainda não chegou no Brasil, mas eu vou viajar e consigo comprar”, gaba-se.

Ao fazer um conteúdo sem maquiagem sobre o impacto que as técnicas de sedução, como ele nomeia, causam nas pessoas gerou 8 milhões de visualizações no TikTok. Foi seu ponto de virada. Começou ali um crescimento rápido e orgânico de seguidores no Instagram. Matheus e Osmar “descobriram” uma fórmula para viralizar e passaram a replicar o formato.

Os óculos são um símbolo tão forte que, assim que os veste, Matheus parece assumir um alterego: o especialista capaz de eliminar a timidez das pessoas, à semelhança de Hitch, o conselheiro amoroso do icônico filme dos anos 2000, que também prometia mudar o comportamento das pessoas.

A fama nas redes sociais de Matheus logo atraiu pessoas com dificuldades de socialização, introvertidos, ansiosos, tímidos, que veem nele uma espécie de mentor. E, como Hitch, ele os acompanha por três meses, com exercícios, passeios e tarefas, garantindo que consegue “destravar qualquer um”. Ele conta ter desenvolvido um método que combina técnicas teatrais, de sedução, retórica e neurolinguística.

“Um empresário de 50 anos com dificuldade de fazer networking, eu levei para fazer o que vocês viram. Imagina ele gritando no metrô lotado, e se expondo a situações que antes ele não faria, ele me agradece até hoje”, lembra o tiktoker.

A transformação de Matheus Camargo

Antes da popularidade nas redes sociais havia um outro Matheus, o acadêmico com uma carreira promissora, formado em Direito pela Universidade de São Paulo, considerada a melhor da América Latina. Pode frequentar o Largo São Francisco, berço da elite jurídica do País. Apaixonado por retórica, desenvolveu um interesse sobre o assunto, que havia caído em desuso, mas que Matheus por amar filosofia fez questão de reavivar.

Matheus trabalhava como advogado em uma das famosas Big Laws brasileiras, como são chamados os importantes escritórios de advocacia, um ambiente de competitividade e com jornada de trabalho de longas horas. Um mundo conhecido pela pressão constante e relatos de burnout, a síndrome de esgotamento profissional.

Antes desta entrevista, Camargo havia acabado de chegar de Pouso Alegre, cidade onde cresceu em Minas Gerais. Compareceu no aniversário da irmã. Ficou mais um dia para que pudesse comemorar também com os avós. Lá foi chamado atenção pelo seu pai, que disse que a sua rotina de trabalho não estava saudável, afinal agora trabalha todos os dias da semana e praticamente o dia todo. 

Segundo ele, amava a advocacia e o seu trabalho no escritório, mas a vontade de fazer algo criativo, que fosse seu, e que ajudasse as pessoas fez com que tomasse a decisão de pedir demissão. Este é o momento que Matheus tinha para se jogar no mundo atrativo da internet, dos altos ganhos da vida digital.

Os desafios da Geração Z

Camargo tem 25 anos, faz parte da geração Z que foi criada de frente para as telas, imersa em milhares de imagens de opulência, realidades falseadas e promessas de ganhos rápidos de maneira astronômica. Mas ele desconversa: “Eu não faço pelo dinheiro, o meu propósito é outro, mas não vou negar que como advogado eu demoraria no mínimo uns 12 anos para ser um sócio do escritório e no mundo digital eu projeto cinco anos para estar rico”.

Quando a câmera está desligada ele é mais espontâneo e nos empolgamos com suas respostas. Porém, basta ligar a câmera e ele imposta a voz. Parece lembrar que sempre há oportunidade para o marketing da sua empresa, como um roteiro de vendas orgânico.

Em um mundo em que a geração Z apresenta problemas com socialização e que muitas vezes não conseguem olhar nos olhos, Matheus e sua empresa Mais Sociável, é facilmente explicada. Os problemas do futuro talvez não serão os que um advogado poderia solucionar, já que a inteligência artificial, talvez, lidará melhor. Mas os problemas humanos, estes continuarão a depender de pessoas.  Matheus parece ter entendido esta lacuna da sua geração.

No fundo, seu discurso não é somente sobre autoconfiança mas também sobre liberdade. O que ele ensina, ao gritar no meio de um shopping ou deitar no chão, é uma espécie de desapego, o direito de ser ridículo sem culpa, de se expor sem medo. No mundo das aparências, Matheus oferece um raro convite à autenticidade, e talvez por isso muitos queiram ouvi-lo.